sexta-feira, 24 de dezembro de 2010

O Mercenário e a Assassina

Stella é uma assassina silenciosa, suas habilidades consistem em matar rapidamente, sem deixar sujeira pelo caminho. Eu, particularmente, sou limitado a imitar as habilidades daqueles que enfrento, então, neste instante, sou como ela. A pergunta é: o que um assassino silencioso faria caso ele não quisesse matar sua vitima.


Foco! Primeiro preciso sair dessa chave de perna e depois começar a pensar. Hora da ação!


Livro minhas mãos com alguma dificuldade, giro no chão com ela, me machucando enquanto saio do estrangulamento. Me ponho de pé atacando com chutes giratórios, mas ela não me dá descanso. Stella já está fazendo os movimentos certos para se esquivar de cada um dos meus ataques e me aplicar a sua chave de braço enquanto dançamos o flerte silencioso daqueles que querem se matar.


Vamos Oliver, não é tão difícil: braço por cima do ombro, esquiva por de baixo do braço, chute na costela, giro preventivo, as mãos de Stella agarram meu pescoço. Quase! Seguro o antebraço dela evitando um terceiro estrangulamento. Stella é boa, mas, como toda mulher, não é tão forte. Consigo segurá-la e conter seus chutes em uma série de dezesseis movimentos, todos minuciosamente calculados. Ela finalmente está imobilizada, pelo simples fato de não ter tanta força quanto eu.


E então o impossível acontece. Ela dá uma cambalhota por cima da minha cabeça antes mesmo de eu entender como ela se soltou. Agora tenho uma assassina atrás de mim e só me dou conta quando a ponta da lamina dela espeta minhas costas. Pulo para o lado e sinto o sangue escorrer pelo corte na minha carne. Por pouco que a adaga não alcança meu rim.


Dor. Não estou habituado a isso. Poucos tem habilidade o suficiente para me proporcionar essa sensação. Pare de pensar em coisas idiotas, seu inútil... Você nunca vai ter uma chance desarmado... O Escudo! Marfim deve estar em algum lugar desse chiqueiro.


Olhe para todos os lados, olhe para todos os lados... Ali!


Me esquivo de uma segunda estocada enquanto rolo pelo chão imundo do deposito de armas. Posso ver minha rival e sua adaga ensangüentada, pronta para me estraçalhar. Não vai ser hoje, Stella! Corro por uns três passos e alcanço meu escudo branco. Eu não sei fazer praticamente nada sem usar o meu dom de copiar, mas depois de dez anos treinando incessantemente com Marfim, eu finalmente posso dizer que eu sei usar um escudo.


A Adaga! Bloqueio com o escudo na altura do meu peito. Como Stella chegou aqui tão rápido? Outro golpe? Dobro meus joelhos e levanto o escudo na altura da cabeça. Merda! Mas que... Mais um? Merda! Defendo meu abdômen e minhas pernas, atento para ela não atacar meu rosto desprotegido. Quantos golpes essa mulher consegue desferir por segundo? Faça alguma coisa seu mímico de araque. Marfim não vai livrar sua cara a noite toda. Ela é mais ágil, mas eu posso acertar a cabeça dela com o escudo. Impacto. Deu certo, ela esta cambaleando! Bato mais uma vez com Marfim. Por essa ela não esperava! Gancho de direito agora! Isso! Termino com uma rasteira, e ela cai no chão com os olhos zonzos, quase inconsciente. Não vou subestimá-la dessa vez, vou até o chão e a imobilizo com o meu peso sobre o escudo. Quero matá-la.


Acalma-se, você não é um assassino. Você é um mímico que mata por dinheiro e não por esporte.


Certo. Agora respire e pense. Quase morto por sua amiga, pela segunda vez no dia, algo definitivamente está errado. Mas você deve ouvi-la, sabe disso. Stella não age sem pensar. Ela tem um bom motivo para ter feito o que fez... Diga alguma coisa.


- Diga alguma coisa ! – mal consigo falar de tão ofegante.
- Graças à deusa, você finalmente acordou – ela consegue cuspir algumas palavras.
Agora era ela que estava quase sem ar. Stella abriu um sorriso para mim, como se a morte fizesse parte da rotina dela ou como se ela soubesse que eu não a mataria.
- Você estava dormindo esse tempo todo Oliver. Desde que voltou da sua viagem fora do Reino. Victorio e Fierce estão fazendo praticamente todas as missões entregues à guilda, eles estão recebendo muito mais ouro do que você. Não posso permitir que você continue com esse corpo mole, não quero que você viva de migalhas.
- É isso? Tudo isso para eu acordar? Poderia ter me chamado para conversar, ou até mesmo deixar um bilhete no meu armário. – solto-a, não sou muito chegado a sentimentos ou até mesmo a emoções, mas eu diria que eu estava com um pouco de raiva quando a larguei.
Como se não fosse o suficiente, ela se levanta e começa a ajeitar seus trajes, tirando a sujeira como se nada tivesse acontecido.
- Me dê um motivo, para não me zangar com você – digo isso cruzando os braços, pronto para repensar na nossa amizade.
- O ouro de sua ultima missão já está separado, passe na Tesouraria para reivindicá-lo. A grã mestra “provisória” já têm uma nova missão para você, portanto se apresse! Caso continue fazendo corpo mole, não usarei apenas cordas e adagas da próxima vez.


E essa é a sua maior aliada dentro da guilda, Oliver. Você realmente sabe como fazer boas amizades.


Eu devo ser o pior devoto da deusa da luz que existe e ela me odeia por isso. É a única conclusão que consigo chegar. Matar vai contra tudo o que eu aprendi na igreja de Trima. Se eu fosse mesmo um seguidor da deusa, eu deveria ser bom e justo. Mas a verdade é que não me sinto mais assim. Todo esse sangue criando crostas espessas em minha espada, me deixa muito longe do caminho da luz. Posso sentir as trevas fazendo um ninho em meu coração.


Pare com heresias em sua cabeça, Oliver! Trima é piedosa, ela jamais o deixará!


...


- Bem vindo Oliver, eu estava a sua espera – disse a grã mestra “provisória”.
Marry foi minha companheira de missão desde que eu entrei na guilda, e ainda não consegui me acostumar com ela em um degrau acima de mim na hierarquia.


- Como o conheço bem, separei uma missão especial para você. O seu tipo preferido de matança.
- Não me confunda consigo mesma, Marry. Não gosto do que eu faço. Faço pelo ouro e somente pelo ouro – odeio quando ela faz isso.
- Ah! Mas eu aposto que dessa vez será diferente. Sua missão é simples, meu estimado amigo. A inteligência acredita que um dos feudos próximo aos limites de Rosenburgo está sendo regido por um cultista das trevas, um seguidor de Koli! Como sabe, a coroa real de Helen não pode admitir um culto a deusa maligna tão perto da capital. As ordens são de execução imediata.
- Espero que não esteja inventado isso só para tirar sarro da minha cara.
- Bem que eu gostaria. Mas é a verdade. O senhor feudal conta com um exercito particular de quase cem soldados, provavelmente também envolvidos com o culto às trevas. O lugar é muito bem protegido e cheio de armadilhas. A boa noticia é que a recompensa é cinco vezes maior do que a o que você costuma ganhar, pois se trata de uma missão quase impossível para um único mercenário. Meu conselho é que divida a missão com um time de dois ou três aliados, você tem passe livre para escolher quem quiser.
- Não será necessário. Conheço a pessoa certa para o serviço. Considere essa missão cumprida.


Stella estava certa, eu precisava acordar. Já consigo sentir os deuses conspirando ao meu favor novamente. Em uma só estocada, livrarei meu reino de uma ameaça sombria, ganharei ouro o suficiente para as festas de fim de ano e finalmente terei a oportunidade de rever um velho amigo de missões suicidas e tavernas duvidosas.
Aquele desgraçado vai ter mais motivos para me odiar. Mal posso esperar.

segunda-feira, 15 de novembro de 2010

Oficina de Pergaminhos

O que aconteceu com aquele Oliver pronto e preparado para tudo? Agora sim, posso dizer que estou ficando preocupado. Preciso reencontrá-lo o quanto antes ou acabarei morrendo, tendo o meu próprio desleixo como carrasco.

Que tipo de armadilha é essa afinal? Um sistema simples de cordas. Ainda não acredito que fui capaz de cair nesse tipo de coisa. Mas não importa mais. Tenho sorte de não ter quebrado meu pescoço quando fui suspenso. Logo essa forca vai cessar de vez a minha respiração. Preciso pensar em um jeito rápido de sair daqui.

Vamos começar pelo lugar. O depósito de armas da guilda. Ninguém visita esse chiqueiro a séculos. Todos os mercenários têm suas próprias armas, eles sabem que as daqui são o mesmo que lixo. O lugar esta imundo e o vazamento de água fez com que uma poça de sujeira tomasse conta do estoque de espadas, todas estão podres e enferrujadas.

A guilda dos pergaminhos é um lugar sem par em toda a cidade de Rosenburgo. Para os cívis e aqueles que desconhecem as verdadeiras atividades da Guilda, somos conhecidos como a “Oficina de Pergaminhos”. Uma loja refinada, que vende desde os mais variados tipos de pergaminhos até artigos de decoração e moda, feitos com peles de animais e monstros mortos. As bolsas de couro de minotauros, são as mais famosas.

Mas tudo isso é apenas uma fachada. Se você tem o mínimo de conhecimento sobre o
submundo de Rosenburgo, provavelmente sabe que o estabelecimento é apenas um disfarce
para ocultar o seu principal fim lucrativo: A contratação de Mercenários. Existem três ativos nesse momento, trabalhando a serviço da Guilda. Eu sou um deles, e os outros dois são os principais suspeitos de terem preparado essa surpresa de "boas vindas".

Victório é um assassino renomado, um elfo de pele bronzeada, o tipo mais perigoso que existe. Ele ostenta um histórico de façanhas quase impossíveis a serviço da guilda, e seria difícil andar pelas ruas, se aqui não fosse Rosenburgo, a capital do comércio, onde todos são bem-vindos. O Desgraçado havia se desligado da guilda já faz algum tempo, mas voltou recentemente pelo mesmo motivo que todos voltam, o ouro.

Fierce com certeza não pode ser subestimado. Ele é o novato da “Oficina de Pergaminhos”, mais tem potencial para ser o Mercenário mais bem sucedido dos últimos anos. O garoto é um gênio na arte de matar. Espero que o seu sucesso nas ultimas missões, não tenha subido a cabeça dele ao ponto ter preparado uma armadilha dessas.

Não, não foi nenhum dos dois. Eles estão muito ocupados competindo entre si para saber quem é o melhor. E como eu disse antes, sou o pior mercenário de toda a história, eles não se sentem ameaçados por mim, nem um pouco. Então quem mais seria? Marry, a atual grã mestra? Quase impossível. Ela está ocupando o cargo apenas temporariamente. Enquanto isso, nossa verdadeira mestra está em “missão de descanso”. Marry também é uma mercenária, já faz isso a mais de dez anos, é a mais experiente da guilda, e nos damos muito bem, ela merece esse voto de confiança.

Mais alguém? Toni, o zelador? Com certeza ele tem perícia o suficiente para montar uma engenhosidade discreta e mortal como essa. Na verdade ela é até muito simples para o experiente Toni. Ele faria algo mais elaborado. Não foram eles tambem, tenho certeza. Mais a essa altura não faz mais tanta diferença. Já estou começando a sufocar. Quem mais poderia ser. em quem eu não pensei ainda.

Mas é claro! Oliver, seu idiota. Como foi esquecer dela, a tesoureira! Droga, estou morrendo. Será que ainda consigo dizer algumas palavras...

- Stella! Stella! Pode sair... De onde estiver... Já sei... Já sei que isso é coisa sua.

Um zunido de lâmina corta o ar e como em um passo de mágica, estou livre da corda.

- Stella, é você mesmo?

- É claro que sou eu, Oliver. Quem mais seria capaz de quase te matar e salvar a sua vida em um mesmo dia ?

Stella. Pensando desse jeito, fazia mesmo sentido. Deveria ter pensado nela desde o início, já poderia estar livre há alguns minutos. Mas algo está errado. Stella é minha amiga. Nossa historia começou muito antes de entrarmos na guilda, por que quase me matar agora?

- Acorde Oliver! – ela disse, já desferindo a adaga empunhada, em direção ao meu peito.

Me esquivo com a velocidade de um assassino, prendo o braço dela com uma serie de
movimentos planejados, e termino torcendo sua mão, a obrigando a largar sua adaga. Que coisa inutil. Estou usando as técnicas dela, não tenho chance. Enquanto se solta, Stella gira em torno do meu corpo, um balé mortal, terminando com as duas pernas cruzadas em meu pescoço e minhas mãos presas pelas dela. o peso aplicado no lugar certo, me leva ao chão, novamente sufocando. Ela é mais habilidosa, não tem jeito. Não vou conseguir.

Pela deusa da Luz, Oliver. Foco! Ainda não acabou!

(Continua...)

sábado, 23 de outubro de 2010

Recomeço

Não sou de me queixar, se me conhece provavelmente você sabe disso. Mas a verdade é que meu retorno à guilda não foi nada agradável. Também não quero que me entenda mal, não estou culpando a presença de novos integrantes ou a ausência da Grã Mestra, que atualmente se encontra em uma missão de “descanso”. Não, eu sou o único culpado de meu próprio desgosto.

Estou longe de ser um bom mercenário, todos naquele lugar sabem disso. Matar não é exatamente algo que eu goste de fazer. Devo admitir que com o meu “dom”, é uma tarefa um tanto quanto fácil. Ainda assim, a quantidade de moedas de ouro que acumulo a cada missão, parece cada vez menor, em outras palavras a própria recompensa (a melhor parte de ser um mercenário) parece não valer mais a pena.

Se essas palavras estivessem em uma carta eu provavelmente terminaria por aqui, mas não é o caso. O pedaço mais próximo de pergaminho está a quilômetros daqui, e esses pensamentos logo se perderam e eu nunca terei a chance de registrá-los... que coisa estúpida de se pensar afinal.

Foco, Oliver. O alvo está bem a sua frente. Graças a deusa pensamentos não comprometem camuflagens, e a sua ainda está bem segura. Esse galpão é distante e pouco freqüentado, ninguém ouvira os sons da batalha. Tudo bem. Agora Ele está próximo o suficiente, pode se levantar e caminhar até o alvo.

Contato visual, bem a tempo. Está se preparando para reagir... O que enfrentarei dessa vez? Um soldado ? Um feiticeiro? Um servo dos deuses ?

...

Certo. Esse golpe passou bem perto. Ele têm um bom equilíbrio, empunhou a espada e o escudo em menos de dois segundos, definitivamente um guerreiro. Vou precisar de mais dois ou três ataques pra entender como ele luta. Aí vem o segundo, corte de cima para baixo em diagonal, cliché. Dou um passo para trás, estou salvo e propositalmente desprotegido, quero receber o terceiro golpe.

Argh!! Uma cabeçada? O que é isso? Estou enfrentando um Bárbaro? Tudo bem... Doeu um pouco mas agora já sei do que ele é feito. Balanço, força e agressividade. Habilidades fáceis de se reproduzir. Minha vez. Passo para frente, meu golpe é desferido ao mesmo tempo em que saco minha própria espada, de baixo pra cima em diagonal. Meu inimigo não entende nada, a um segundo atras ele poderia jurar que eu era uma presa fácil, e agora me mostro como um adversário a sua altura. Ele ainda não sabe, mas o destino do coitado já esta traçado.

Eu tinha certeza de que o golpe seria evitado, meu oponente se esquivou como eu me esquivei, deu um passo para trás, um erro fatal. Minha própria cabeçada acertou-lhe de um modo feroz e impiedoso. Ele ainda não entendia o que estava acontecendo. Em segundos me tornei uma máquina de combate. Chute, soco, corte, corte, corte. Agora eu era muito mais balanço, força e agressividade do que a minha próxima vítima jamais seria.

...

No final, restavam-lhe apenas duas costelas intactas, um escudo despedaçado e uma espada pela metade. Samuel Handfor. Acredito que esse era o nome dele, um contrabandista de armas, que ameaçava os interesses da coroa real de Helen. Não poderia mais viver.

E não viveu.

Morreu com Ébano, minha espada negra, encravada bem no meio de seu estômago. Uma morte limpa, para um oponente sujo e corrupto. Ele nunca saberia o porque de sua derrota. Nunca entenderia o meu dom de “Copiar” as habilidades daqueles que enfrento. Jamais se daria conta de que seu algoz, foi um mímico atormentado, sem sua própria vocação, que apenas fazia imitar. Não havia criatividade.

Um espelho com vida, um artista do vazio...

Pela deusa, Oliver... Foco! Missão completa. Retorne à guilda, pegue o ouro e pare de tagarelar com a sua mente. teste